A tradição oral cristã e sua importância aos cristãos primitivos
“Assim, pois, irmãos, estai firmes e conservai as tradições que vos foram ensinadas, seja por palavra, seja por epístola nossa”. (II Tessa. 2:15)
“Conserva o modelo das sãs palavras que de mim tens ouvido na fé e no amor que há em Cristo Jesus” (II Tim. 1:13)
“E ainda muitas outras coisas há que Jesus fez; as quais, se fossem escritas uma por uma, creio que nem ainda no mundo inteiro caberiam os livros que se escrevessem” (João 21:25)
“Jesus, na verdade, operou na presença de seus discípulos ainda muitos outros sinais que não estão escritos neste livro” (João 20:30)
Ao longo de nossos estudos, já vimos grande parte da tradição oral judaica, seja através do Talmud, seja pelos escritos do hassidismo, seja através do Zohar, ou mesmo dos sábios em seus comentários à Bíblia. Mas sabemos também que o cristianismo começou através de Nosso Senhor Jesus, o qual ensinava através de sua própria vós, e somente assim. Assim não se deve apenas seguir a tradição escrita e sem a interpretação devida, caindo no erro de apenas usar do texto sem o espírito que o acompanha, numa espécie de letra morta. Para tanto, aqui veremos as lições dos cristãos primitivos e da tradição, que foi ainda citada por vezes por Paulo, que sim a respeitava, ao lado da letra das Escrituras e juntamente com essa.
Quando Jerônimo fez a tradução do Evangelho de Mateus, fato foi que encontrou um escrito em linguagem codificada, tendo grande dificuldade no trabalho. Isso se devia por haver uma tradição oral, que era ditada de boca a boca. Assim conseguiu autorização a traduzir uma versão da biblioteca de Cesaréia, dos nazarenos. Algumas vertentes do cristianismo somente usavam esse escrito, como os cristãos judeus e os ebionitas. Assim existiam ensinamentos que eram dados apenas a discípulos de forma oral, os mistérios cristãos. Isso parece estar conservado na igreja em atos como imposição das mãos, exorcismo, certas orações, símbolos, nomes e ordens de anjos e assim vai. Possivelmente essa tradição oral esteja conservada ainda em mosteiros localizados na Círia e na Grécia. Também é possível que esteja entre ordens como a dos Jesuítas, Franciscanos e Beneditinos, podendo se notar através dos cantos desses últimos (basta ler tradução de canto gregoriano).
Vemos pelo que escreveu João, que muita coisa que Jesus fez não foi registrada, e nem poderia ser apenas em livros. Assim por certo que ensinamentos mais poderosos foram dados de boca a boca. Nota-se nos evangelhos apócrifos esses ensinamentos mais reservados de Cristo, como em Tomé e em Felipe. Mas tudo indica que a própria Igreja conserva a tradição oral, através de sua tradição apostólica e mesmo dogma. Dizem que a própria escolha do cânon do Novo Evangelho foi feita com base na tradição oral, o que explica essa escolha de livros para o compor. Vemos assim na lição do cristianismo primitivo. A tradição oral é assim a tradição apostólica.
Após a morte do último apóstolo, continuou a tradição cristã em um cristianismo pré-evangélico. Assim, sem escrituras. Isso até o momentos em que foi escolhido um cânon, de modo que até se usava alguns escritos, muitos do que depois foram tidos por apócrifos. Mas vale a lição dos padres da igreja primitiva, que falam sim em tradição oral e de sua importância. Segundo Basílio de Cesaréia: “Investiguemos quais são as nossas concepções comuns acerca do Espirito, assim como as que obtemos a partir da Sagrada Escritura em relação com aquelas que recebemos da Tradição não-escrita dos Padres" (Do Espirito Santo 9,22). Segundo Pápias de Hierápolis: “Eu não pensava que as coisas conhecidas pelos livros não me ajudassem tanto quanto as coisas ouvidas, através da palavra viva e permanente" (Explicação das Sentenças do Senhor) E segundo Tertuliano "A quem compete a fé, a fé a qual se referem as Escrituras? Por quem, por meio de quem e a quem a doutrina que nos fez cristãos foi transmitida? Porque onde parecer estar a verdade da doutrina crista, ai estará a verdade das Escrituras, a verdade das interpretações e de todas as tradições cristãs (...) Foi inicialmente na Judeia que (os Apóstolos) estabeleceram a fé em Jesus Cristo e fundaram Igrejas, partindo em seguida para o mundo inteiro a fim de anunciarem a mesma doutrina e a mesma fé.” (Da prescrição dos hereges).
Continuando a lição dos padres da Igreja primitiva, segundo Irineu de Lião: "E se os Apóstolos não tivessem deixado quaisquer Escrituras, não se deveria seguir a ordem da Tradição que eles legaram aos mesmos aos quais confiaram as Igrejas? Este método e seguido por muitos povos bárbaros que creem em Cristo. Sem papel e sem tinta, estes trazem inscrita em seus corações a salvação por obra do Espirito Santo, conservando fielmente a antiga Tradição" (Contra as Heresias). E Orígenes: “Mas como entre os que professam crer em Cristo ha muitas divergências, não apenas em detalhes insignificantes mas ainda em matérias de suma importância (…) parece necessário estabelecer sobre todos esses pontos uma regra de fé fixa e precisa antes de abordar o exame das demais questões (...) Mas como o ensino eclesiástico, transmitido por sucessão ordenada desde os Apóstolos, e conservado e perdura nas igrejas ate o [dia] presente, não se deve aceitar como verdade alem daquilo que em nada divirja da Tradição eclesiástica e apostólica (...) ” (Carta 67,5). E por fim Atanásio: “Mas nossa fé e reta e tem sua origem no ensino dos Apóstolos e na Tradição dos Padres, ambas confirmadas tanto pelo Novo quanto pelo Antigo Testamento” (Carta 60).
Assim superando as diferenças políticas e o combate a heresias, vemos que resta uma tradição oral, esta conservada aqui e ali nas igrejas, e assim disponível par aquele que as buscarem. Isso nos mostra o sentido das escrituras, e forma um verdadeiro Talmude cristão, que nos dá o norte a o que podemos entender e sobre hermenêutica. Vemos isso conservado em grande parte nos escritos de Agostinho de Hipona e mesmo em Tomás de Aquino, e assim percebemos que já temos disponível esse elevado saber, apesar de ser trabalhosa a busca, uma vez que são muitos trabalhos a respeito da fé. Como aqui faço mais um trabalho jornalístico e científico, sei que de bom uso será a reflexão, e que aos poucos essa minha obra se torna mais necessária, a fim de não se perder na mera letra morta, se confundindo com o que realmente ensinou o Senhor Jesus e e o que realmente ensinaram as Escrituras.