Mariano Soltys
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Filme Passageiros e a filosofia de Allan Kardec

 

 

Da direção de Rodrigo Garcia, Passageiros une a história de um conflito existencial, que nos leva a pensar no mito de Sisifo focado por Camus, até em um espiritualismo, que por fim faz pensar em Allan Kardec. Filósofos atuais pensam nesse autor como Cléverson Israel Minikovsky e também Fídias Teles. Fato é que o filme começa em um romance interessante, de um homem que jogou vida fora em trabalho e de uma mulher que é psicóloga, e que por surpresa ajuda sobreviventes de desastres aéreos.

O filme tem bom elenco e uma fotografia interessante, sem os exageros de filme O Sexto Sentido, que tem a mesma tônica, e nem qualquer pista que revele seu segredo. Assiste-se o filme todo e apenas no final se descobre a natureza dos protagonistas, todos espíritos após a morte, e que interagem de modo mundano e normal. Quando vemos as questões de Kardec na obra O livro dos Espíritos, percebemos que o mundo espiritual e após a morte é cheio de ocupações, bem diferente de um mero descanso ou dissolução. Tese importante do livro é que existe vida em mais mundos ou locais e na evolução do espírito, através das vidas ou encarnações.

Mas o dilema principal do filme até se saber de não estarem vivos é o ‘carpe diem’ do protagonista, e da limitação da ciência da psicóloga em ajudar as pessoas. E o antagonista é o piloto do avião, que antes se apresenta como um manda-chuva da empresa aérea, tentando livrar esta da indenização, uma vez que se desejava provar que avião teria explodido e caído, com uma falha mecânica. Por fim ele quer sim ter a responsabilidade, e não proteger a companhia, sendo assim compreendido. A ética espiritual parece ser uma questão também central, além do romance, que traz o questionamento do comportamento da ter5apeuta, a qual tem caso com esse paciente, o acidentado passageiro.

Mas pensando na teoria espírita, a morte pode vir e não se saber estar morto. Assim muitos ficam perdidos e em caso de acidente grave isso se amplifica. A evolução ou apego a matéria são fatores-chave. Lembro aqui duas questões que achei de início, como a 305: “305. A lembrança da existência corporal se apresenta ao Espírito, completa e inopinadamente, após a morte?“Não; vem-lhe pouco a pouco, qual imagem que surge gradualmente de uma névoa, à medida que nela fixa ele a sua atenção.” E a questão 163 e 164: “163. A alma tem consciência de si mesma imediatamente depois de deixar o corpo? “Imediatamente não é bem o termo. A alma passa algum tempo em estado de perturbação.” 164. A perturbação que se segue à separação da alma e do corpo é do mesmo grau e da mesma duração para todos os Espíritos? “Não; depende da elevação de cada um. Aquele que já está purificado, se reconhece quase imediatamente, pois que se libertou da matéria antes que cessasse a vida do corpo, enquanto que o homem carnal, aquele cuja consciência ainda não está pura, guarda por muito mais tempo a impressão da matéria.”. Nos personagens do filme se percebe esse apego ao mundo e uma quase ausência de espiritualidade. Para tanto, as pessoas demoram a saber que desencarnaram.

 

Mas o filme tem boa ação e um certo aspecto intelectual, sendo inteligente. A atriz é simpática e ambos são sozinhos, o que atrai o espectador mai carente. Falar-se em teorias de psicologia é algo que se encaixa bem, e aos poucos parecia mais uma paranormalidade dos sobreviventes que um mero desencarne. A transição se envolveu em mistério e outros fatores poderiam ser abordados, como avisos e visão de espíritos antes da morte, como os relatados por Ernesto Bozzano. Mas é um filme diferente, que não abusa de efeitos e que leva a essa reflexão existencial e moral, e até onde nossa sociedade pós-moderna abusa de trabalho e aproveita pouco a vida. O personagem principal é uma crítica a esse aspecto pouco divertido de nossa vida. Também faz refletir sobre a solidão, e sobre a necessidade de uma nova vida que leve em conta a beleza da vida, e seu hedonismo. Lembra-nos um pouco de Epicuro e da necessidade do relacionamento, seja a amizade ou outro, e de uma autoanálise. Fato é que o espiritismo vem como recheio final para colocar mais ainda o destaque dessa bela produção, ainda que não tão valorada. Um filme inteligente e envolvente, romântico e diferente.

Mariano Soltys
Enviado por Mariano Soltys em 16/06/2014
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